Tive um debate um tempo atrás com um rapaz criacionista que advogava ser o Genesis um livro histórico, dentre outras "viagens" criacionistas. Pois bem, vou postar aqui minha resposta a ele, basicamente sobre o texto em Genesis 1. Inicialmente, em minhas considerações, falarei um pouco sobre o paralelismo, uma forma típica da poesia judaica bíblica. Então vamos lá:
Vamos acompanhar o que o
Centro de Pesquisas do Hebreu Antigo tem a nos dizer sobre o
paralelismo: Como a poesia hebraica é escrita de uma forma muito diferente do que o nosso próprio estilo ocidental de poesia, muitos não reconhecem a poesia, o qual pode causar problemas quando da tradução ou interpretação das passagens. Aproximadamente 75% do Tanach (Velho Testamento) é poesia. Todos os Salmos e Provérbios são poesia hebraica. MESMO O LIVRO DO GENESIS É REPLETO DE POESIA. Existem diversas razões para os Hebreus terem usado poesia. Muito da Torah foi cantada. Poesias e canções são mais fácies de memorizar do que textos corridos. A poesia paralelística (COMO em GENESIS 1) enfatiza algo de grande importância, como a estória da criação o é. Os rabinos acreditavam que se alguma coisa é digna de ser dita, ela deve ser ditaa de uma forma cheia de beleza. Existe muito mais poesia na Bíblia do que muitos pensam porque a maioria das pessoas não a entende.[Tradução nossa]
Alguns sites de apologética criacionista tal como o
Christian Answers [que sustenta a insustentável idéia de que foi Moisés quem escreveu a Torá] ou o
Lambert Dolphin através de alguns artigos tais como
Syntax and Semantics in Genesis One e
Is Genesis Poetry or Historic Narrative sustentam a idéia de que Gênesis 1 seria uma narrativa histórica ao invés de um texto poético. O argumento básico utilizado é o que o texto em Gênesis não contem a estrutura básica do poema hebraico chamado paralelismo. Tal estrutura poética se dá quando o autor se utiliza de duas ou mais formas diferentes para falar sobre algo. Inexistiria tal estrutura então no Gênesis? Confiram o que
este artigo tem a nos dizer sobre isso. A conclusão do mesmo se dá na seguinte forma: Deve ser lembrado que os modernos pensadores ocidentais vêem os eventos em uma lógica de etapas. Esta é a a idéia de que cada evento vem depois de um prévio formando uma série de eventos em uma linha do tempo linear. Mas os Hebreus não pensam em uma lógica de etapas mas em uma lógica de blocos. Isto é o agrupamento conjunto de idéias similares juntas ou não em uma ordem cronológica. A maioria das pessoas lêem o Capítulo 1 do Gênesis através de uma perspectiva de lógica de etapas ou cronológica, menos do que através de blocos lógicos tão comum na poesia hebraica.[tradução nossa]Como pode ser visto, a devida atenção às tradições orais do povo hebreu bem como da real e concreta atenção às variações da forma poética do paralelismo irão nos mostrar a poeticidade do texto em Genesis.
Como um belo exemplo dessa poeticidade, podemos encontrar
nessa tradução para o inglês ou na versão de Haroldo de Campos [
BereShit], certamente um dos nosso maiores tradutores nacionais, a qual colocarei os primeiros versos e que pode ser encontrada à venda
aqui : 1. No começar Deus criando
O fogoágua e a terra
2. E a terra era lodo torvo
e a treva sobre o rosto do abismo
E o sopro-Deus
revoa sobre o rosto da água
3. E Deus disse seja luz
E foi luz
4. E Deus viu que a luz era boa
E Deus dividiu
entre a luz e a treva
5. E Deus chamou à luz dia
e à treva chamou noite
E foi tarde e foi manhã
dia um....
Finalizando, me lembro de uma frase de um amigo poeta, o Flávio Boaventura que nos dá uma dica bem sutil sobre a questão da sensibilidade e da poesia. A frase é a seguinte:"Quem define a poesia, definha a poesia."
Ps. Estes criacionistas realmente são da pá-virada. Geralmente sempre tem algum físico Phd da Nasa que lecionou no MIT ou alguma Universidade Européia e tal... nunca falta. Mas o cúmulo do cúmulo é realmente este site chamado
The Earth is Not Moving.
[Ouvindo: Brade - Canzon -
(205) (Music of the Waits) - Dance Music of the High Renais (2:50)]