★ Flávio Souza Cruz ★

★ D R E A M S ★

★ M A G I C ★

★ F A N T A S Y ★

domingo, maio 18, 2003

O livro de hoje é uma coletânea com os trabalhos de João Gilberto Noll, editada pela Companhia das Letras. Ela é composta por 'O cego e a dançarina', coletânea de 24 contos publicada em 1980 pela Civilização Brasileira, além de alguns outros contos publicados esparsamente e por 7 romances, sendo eles 'A fúria do corpo'(1981, Record), 'Bandoleiros' (1985, Nova Fronteira), 'Rastros do verão' (1986, L&PM), 'Hotel Atlântico' (1989, Rocco), 'O quieto animal da esquina' (1991, Rocco), 'Harmada' (1993, Companhia das Letras) e 'A céu aberto' (1996, Companhia das Letras). Eu conheci o Noll a partir do programa de entrevistas do Pedro Bial na Globo News. Ou melhor dizendo, eu ainda estou conhecendo o Noll... o que me leva a refletir sobre o tanto de clássicos que lemos, sem nos darmos o tempo de ler os que estão conquistando espaço e os que estão ainda por conquistar. Isso sem falar naqueles que se encontram num tal lugar enaltecido pelo acaso farto de horas, pessoas e lugares certos em momentos "certos?". Hoje eu li um poema no Suplemento Literário da Imprensa Oficial. Estava na primeira página e era uma frase apenas estruturada em linhas como um poema. Era um frase, mas estava vestida de poema. A frase era até legal, mas não era um poema. Alguém certamente, além do autor, pensou diferente de mim e o colocou lá na primeira página. Uma vez, conversando com o saudoso historiador Francisco Iglésias, poucos anos antes de sua morte, recebi a seguinte pérola: "eu ainda não terminei de ler Proust, devo eu perder meu tempo com Sangue de Coca Cola?" Não vou me enrolar neste debate sobre sexo de anjos, pois na verdade o que eu acho é que devemos encontrar algum ponto de esquilíbro, mesmo que errático, mesmo que em mutação, na leitura nossa de cada dia [nos dai hoje]. Anyways...

Estou lendo no momento o romance Hotel Atlântico da coletânea, do qual eu tiro este pequeno trecho:

"Eu ia andando pela rua com os olhos postos em frente, fixos. Ouvia de vez em quando um 'Deus seja Louvado', um cumprimento, não pude deixar de perceber o aceno tímido de uma garotinha. A nada eu respondia. Eu era uma figura desconhecida com o seu bordão, ninguém chegava muito perto. Para alguns talvez eu fosse um homem em constante contato com esferas sagradas, eu não via o mundo visível."


sexta-feira, maio 16, 2003

E a fortuna conspirada com as nuvens, num arrozoado saber matutino, uniu o magro rapaz chamado Egoísmo à velha e gorda Comodidade como se fosse então um casório de fim de tarde, destes de vila escondida. Os dedos entrelaçados se amainavam um ao outro, segurando a vontade da cama vindoura. Não saíram do quarto, é certo. Ele, paixão pra dentro e olhos nos pés, sorriu como a decretrar novos planos secretos. Ela, amaciado saber, acariciava os cabelos do moço. O esquálido coração se deitou no flácido seio da amada. Barriga aberta e umbigo exposto, Comodidade recebia carinhos em círculos e regorgitava mesas e camas passadas num relembrar de prazer. As peles eriçadas copulavam como ondas. A velha moça, por cordial relutância ao início, abrira suas pernas à lascívia inquieta daquele que era um só querer. Um único toque de cordas vermelhas dedilhava notas sem pudor a cada beijo. O Egoísmo penetrava fundo na aberta Comodidade que a cada investida se dizia sua. E mais, e por tanto o mais ao querido gemer, ao tempo de desmaiar gritara amor. A tarde ia longe e era tarde já o horizonte dos desejos a fazer. Da cantada união, rugiu um filho, em inesperado susto, cujo gritar era uma vazia e inaudita dor. A janela se abriu, um rapaz qualquer, uma moça qualquer se voltam para a rua. E por tudo, olhando o vento e os passos, viram o dia e a morta paixão dentro de si. O rapaz desenhou um círculo na janela enquanto pegava o telefone com a outra mão. A mulher, pés descalços, lambeu a página do livro de si mesma e comprou flores. E a fortuna conspirada com as nuvens, num arrozoado saber vespertino, uniu o magro rapaz chamado rapaz à florida moça chamada moça, como se fosse então um casório de fim de tarde, destes de vila escondida.

quarta-feira, maio 14, 2003

Notas do dia - quero apresentar a todos o novo blog da minha amiga Camille Bleue, o "A Moveable Feast". A Camille abandonou o Sem Bússola e agora encontrou um novo rumo na sua Paris Virtual. Um outro blog que está nascendo é o da Andrea Mariz, que também abandou seu antigo blog Aldeia dos Ventos e agora está com o "Hóspede do Tempo " em parceira com o Léo de Morais. Os amigos estão com vontade de renovar e isso é muito bom. Sugiro a todos uma visita aos dois novos blogs. Quanto à mim, a novidade é que agora faço parte da equipe de colunistas do e-zine Cápsula. No próximo domingo, dia 25 de maio, sairá a edição tendo o meu primeiro texto como colunista permanente. Não deixem de assinar o e-zine. Ele não funciona como uma página web, mas como e-mail. Por isso, é necessária a assinatura. Aos meus leitores, mais uma caminho agora - Cápsula.

Nas minhas mãos, As Fábulas de Esopo, texto bilíngue, traduzido por Manuel Aveleza. Para quem gosta das coisas que escrevo, muita coisa vai surgir no Epifania a partir deste livro do frígio Esopo. Aguardem.

Huumm... por falar no fabulista, neste mês ainda vou ao Esopo aqui em Belo Horizonte. Para quem não é da cidade, o Esopo é um restaurante com uma característica muito especial, pois se trata de uma Taberna dos Tempos, um lugar onde podemos encontrar ciganas, caveleiros medievais, reis, bobos da corte, etc. Há uns 15 anos atrás eu já era frequentador do Esopo, localizado na época em um condomínio fechado aqui perto. Era um época muito boa, pois ficávamos lá, na casa do dono, o pintor Ricardo Wagner até o nascer do sol, num ambiente de imersão e fantasia. Alguns anos depois, a casa se mudou para a parte central da cidade e perdeu um pouco do quê de mundo isolado e perdido que possuía. No entanto, para quem não conhece e mesmo para mim que o conheceu nos seus primeiros tempos, o Esopo ainda é um ótimo lugar para comer, beber e se deleitar com as atrações. Ótima dica para quem vier de visita a BH.

segunda-feira, maio 12, 2003

E no terceiro dia de outubro ao norte da cidade de Hersell, foram orar pela morte da palavra. Ao chegar ali, uma virgem, uma prostituta e uma ocupada de pés calçados eram vistas em mármore negro se tocando pelas folhas. A virgem era chamada Helena e morrera ajoelhada pelo frio da espera. A prostituta, cujo nome era Bela, tornada velha empregada, de braços fechados lançou-se num amanhecer. A terceira cujo nome sempre se soube, vivera na boca e na memória de apenas um em Hersell. Cada uma teve seu tempo e glória, carregadas por esperanças, amanheceres e bocas. Na hora, quando todos voltavam os ombros ao horizonte. um ponto cristalino se joga do céu formando o caminho de lágrima nos olhos de Helena. Em bailado marchar, um jornal tocado ao vento vai em cuidado ocupar as vergonhas da moça de calçado pé. Deitada olhando para Deus, virada para o povo de Hersell a última boca de mármore sorri. E da oração pela trina morte fez-se um verso de estertor, partido em quatro linhas de querer, feito poema de criança, ressussitado porvir. As pessoas se foram, as estátuas também.

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