★ Flávio Souza Cruz ★

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sexta-feira, março 04, 2005

"A morte está cansada da morte. O dia está cansado do dia. A morte está cansada da morte. O sangue está na cansado do dia." Tropeça. Cai. "A morte está cansada da morte. O dia está cansado do dia. A morte está cansada da morte. O sangue está na cansado do dia.", repete. A boca seca num esforço, um pigarro.

Em casa, mãos limpas. Sentado. "A morte está cansada da morte. O dia está cansado do dia. A morte está cansada da morte. O sangue está na cansado do dia." Mas nada irá impedir a vida cansada de Maria de Lourdes que se esvai, quase-morta e nem mais um dia.

quinta-feira, março 03, 2005

Na beirada do laranjal moram cheiros do passado dos meus passos. Na beirada do laranjal mora o balanço do meu sorriso. E lá bem fundo, na beirada do laranjal, mora o rio do meu sonho. Lá, bem antes, bem cedo, bem viva eu corria, longe, caminhando nos cheiros, nas folhas do laranjal.


Ela cheirava folhas e sentia peles. Ela cheirava a pele e a sentia folha. Trocava cheiros por lembranças, odores por palavras. E na gramática diária, recitava versos para a rainha da noite. Embalava pétalas no colo e escrevia receitas com as lembranças da infância. A queda no chão, seu choro, o pai correndo... Ela embalava o passado com música do dia. Na beira do laranjal, bem sabia, havia um cheiro para trocar palavras. E a cada abrir das narinas lhe entravam sonhos. Na beirada do laranjal, bem sabia, havia odores de irmã-vida e irmão-sol. Contava as amigas e na roda de dança, contava as folhas, caindo aos montes, lhe fazendo princesa. Ela sabia e bem hoje o sabe saber das palavras que se trocavam sempre. Ela pensava "agora", mas na tinta escrita aparecia "acorda". Ela teimava e era "agora", mas sempre "acorda", a terra dizia. Ela escreveu "acorda" e a terra, e o tudo nela, as sementes, e o laranjal, todo o cheiro, todo o ar se perderam no antigo e sempre. Ela largou o reviver e num aprumo de vida revolveu em viver. Ela era um sopro em cheiro e ficou assim, caminhada, bem parada. Era a mão nos lábios e olhar pra gente. Um sorriso nos lábios e o dedo na boca. Olhar em tudo pra se dizer casta. Ela largou dos laços e nos largou por lá... nos cheirando o ar na busca do que se passou ali, querendo saber, bem cedo... onde mora ela, "a verdade" das folhas, a voz do laranjal.

quarta-feira, março 02, 2005

Um torpor exalado em fel. Mulheres em pranto e um doce ar de canela saindo pelo quarto. O movimento do corpo ajoelhado pendia em pêndalo num ir e vir que beijava o chão e se erguia para o céu.
- O que pedes?
- Por ele.
- Não o sabes ainda?
- Saber?
- Ele já não mais está.
E de pronto, a dor foi mais intensa e seu corpo extremeceu. Vozes penetravam seu corpo e como adagas em curva lhe desfaziam na volta. "Ele já não mais está"..."Ele já não mais está"... Agarra o pano da cama, chora. E cada gota é um dia, cada rosto, um olhar, cada olhar carregado de vida a escorrer. As mulheres chorando, o quarto em pedaço. O corpo retorna a si mesmo, encolhe. As mãos em prece, o joelho como feto. E quisera então naquele momento gritar tudo e se dizer cristã. Perdoar-se da mágoa e se molhar de santa. Quisera então naquele momento desamá-lo em tudo e se dizer ausente, rogando pragas por se sentir ali. "Óh, amada", dissera ele, em compaixão, "Que tudo o fazes pra me amar, e nada tenho além de mim." "E nada tenho", além de ti, "sempre incompleto", agora em mim. E a doce mão do amigo lhe pousa o ombro e tua calça agora é pouso pra teus olhos. "Abraça-me!", os dois dizem. E uma música ressoa no quarto, salgado agora, na largura do céu.


* Montagem feita com fotos de Calvato.
Tenho hoje uma novidade aos meus poucos e preciosos leitores. Depois de muito refletir sobre minha vida e sobre minha vida como escritor, especialmente, resolvi tomar uma decisão. A partir de hoje, escreverei textos literários todos os dias por aqui. Não os garanto no sábado e domingo, mas me esforçarei também nestes dias. De qualquer forma, ao longo da semana "útil" escreverei e postarei sempre, todos os dias. Promessa de pé junto!

Frase da Noite - Eu escrevo para poucos, amigos diletos. Para os muitos, existem os coelhos!

terça-feira, março 01, 2005

Ele procurava a voz, mas a voz se escondia. Ele procurava por uma prova, mas a prova se escondia. Ele teceu mil palavras e as enrolou num tear de vontades em espera. A cada dia tecia e esperava. Pedia e clamava - "fale comigo, me mostra que escutas... ouve-me, retorna-me!..." Mas a voz não vinha. Ele procurava a voz, mas a voz se escondia. Ele procura um tremular, uma batida no vento, mas o ar não ardia. Procurava pelos cantos, mas o vento era apenas castigo, não era vida. Do tear fez teias para lhe abrigar da solidão da voz, dos dias. Mas a garganta clamava e a cada dia à parede pedia "em favor, por mim, fala comigo!" As semanas se refaziam em trilha, mas a voz se escondia. Um belo dia, dá-se o sinal - o telefone toca - dois acordes - ela diz, femina, finalmente, e o tom é carmin - "bom dia, querido..." Mas ali, no assombro do toque, do ouvir em riste e coração cansado, sabia ele, não era ela, aquela voz.

Foi noite, capítulo segundo.

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